Minha mãe costuma dizer que “quem tem boca fala o que quer”. De
fato, somos livres pra expressar nossas opiniões, certo? Ao menos no mundo
ocidental, marcado pela imposta liberdade do liberalismo político e econômico,
esse ditado serve como uma luva.
Nesse contexto, o policial canadense
Michael Sanguinetti disse, em uma palestra, que as estudantes de uma
universidade canadense deveriam parar de ir à aula com roupas de “vadias”,
para acabar de uma vez com casos de estupro no campus.
A questão gerou polêmica. As
estudantes (logicamente) não deixaram barato e criaram o movimento “Slutwalk”
(Marcha das Vadias). A ideia está sendo disseminada pelo mundo inteiro e
milhares de mulheres (vadias ou não) aderiram ao protesto.
Mas, o que protestar? A questão
primordial não é o direito de se vestir como quer. Uma mulher pode se vestir
como quiser para ir ao cinema, ao trabalho, para uma festa. E isso é norteado pelo bom senso.
Por bom senso ser algo relativo e
pessoal, marcado pela influência religiosa, cultural e, principalmente, moral que sofremos, quem somos nós pra julgar o que uma pessoa usa? Isso não significa
nada. E como diz outro bom e velho ditado “o uniforme não faz o estudante”.
Voltando à questão central, o policial canadense perdeu uma grande chance de ficar calado. Ao afirmar essa idiotice ele transformou vítimasem culpadas. A culpa de uma mulher ser estuprada é do homem, o causador da violência. Se o homem se diz racional, como não consegue controlar seus impulsos sexuais diante de uma mulher, e até mesmo diante de meninas (entenda-se CRIANÇAS)?
Voltando à questão central, o policial canadense perdeu uma grande chance de ficar calado. Ao afirmar essa idiotice ele transformou vítimas
Com essa afirmativa estúpida, Michael Sanguinetti disse que as mulheres são culpadas pela irracionalidade dos homens. A eterna
culpa de Eva que levou Adão a comer do fruto proibido e assim Deus os expulsou
do Paraíso. E isso não é novo. A história está cheia de episódios assim. Diante de uma sociedade marcada pelo patriarcalismo (e consequentemente pelo machismo) é sempre mais cômodo culpar a mulher.
Essa questão é séria. Temos essa
tendência a culpar a vítima e “perdoar” o culpado. É muito mais cômodo proteger
homens nesse mundo machista. Existem até mesmo mulheres que concordam com esse
policial, que acreditam que se sofressem algum tipo de violência sexual, a
culpa seria delas que provocaram com a roupa ou o jeito de andar.
Nesse caso, freiras e muçulmanas não
sofreriam assédios e não seriam estupradas, afinal, elas se vestem “muito bem”
e não há nada de sexy em hábitos ou burkas (ao menos pra mim). Mas, ao
contrario, elas são tão vítimas de violência sexual quanto as vadias que
Michael Sanguinetti falou. O estupro, inclusive, foi usado como arma de guerra
contra muçulmanas durante a Guerra de Kosovo, causando a morte física e moral
de milhares de mulheres. E agora, de
quem é a culpa?
Seria cômico se não fosse trágico, mas a culpa é sempre da
vítima (isso precisa ser sempre frisado). Uma criança de 5 anos é abusada sexualmente (e não vamos fechar os
olhos pra essa realidade) mas o estuprador tem a audácia de dizer que ela o
provocou. WHAT????? CUMA?????? Simplesmente não dá pra entender e mesmo que
desse não faço questão alguma de compreender. Não faz sentido na minha cabeça de vadia um guardião da moral e dos bons costumes usar da força para conseguir o prazer sexual. Nenhum sentido mesmo.
Essa é a lógica do sistema opressor, do sistema que mata: mudar o foco da discussão para manter um mundo cada vez mais conveniente ao interesse de poderosos que não respeitam a liberdade e a igualdade humanas. Isso é o mesmo que mudar o foco do problema, que é muito maior. Quanto machismo presente nas palavras do policial, não?
Essa é a lógica do sistema opressor, do sistema que mata: mudar o foco da discussão para manter um mundo cada vez mais conveniente ao interesse de poderosos que não respeitam a liberdade e a igualdade humanas. Isso é o mesmo que mudar o foco do problema, que é muito maior. Quanto machismo presente nas palavras do policial, não?
Por isso mesmo, me coloco ao lado
das “vadias” do mundo inteiro. Sou uma vadia que hoje está quase vestida como
uma muçulmana, só faltou a burca (é que está muito, muito, muito frio) e
estou gritando “Jesus ama as vadias”, tal como as mulheres do “Slutwalk”. Sou
uma vadia que não aceita o descaso e desrespeito às mulheres (vadias ou não) em todo o mundo. Sou uma vadia porque sonho viver num mundo em que não haverá mais desigualdade
em função do gênero, da etnia ou orientação sexual. Sou uma vadia porque me é insuportável pensar que meninas ainda são vendidas por seus pais para serem prostitutas, sem terem escolha alguma. Sou uma vadia porque é angustiante saber que mulheres muçulmanas são condenadas ao apedrejamento por escolherem outra pessoa para amar. Sou uma vadia porque quero
liberdade; não a liberdade do liberalismo, mas a liberdade da poetisa Cecília
Meireles, que no fascinante Romanceiro da Inconfidência expressa o sentimento
de milhares de oprimidos e oprimidas com os versos “Liberdade - essa palavra,que o sonho humano
alimenta:que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda”, quero a liberdade de escolher o caminho que vai alimentar minha alma e quero saber que o ser que tentar usar da força pra impedir minhas escolhas vai ser punido caso haja assim.
Por isso afirmo que se ser livre é ser vadia, eu sou vadia. Não gosta da palavra vadia? Ela te ofende? Pois o que me ofende é saber que mulheres são violentadas física, sexual e moralmente todos os dias e não está sendo nada feito para reverter esse quadro. Tá na hora de rever certos valores opressores num mundo em que ocorreu a vitória, ao menos teórica, dos direitos humanos.
Por isso afirmo que se ser livre é ser vadia, eu sou vadia. Não gosta da palavra vadia? Ela te ofende? Pois o que me ofende é saber que mulheres são violentadas física, sexual e moralmente todos os dias e não está sendo nada feito para reverter esse quadro. Tá na hora de rever certos valores opressores num mundo em que ocorreu a vitória, ao menos teórica, dos direitos humanos.
Pois é... minha mãe diz “quem tem
boca diz o que quer” e eu respondo “e quem tem ouvidos escuta o que não quer
duas vezes”. E os machistas/conservadores/coronéis terão que escutar nossos gritos de vadias livres, que escolheram o caminho da liberdade e da igualdade. ESCUTARAM?????
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