Em que momento
um sonho começa? Pergunta difícil. Subjetiva. Marcada por influências,
incentivos, medos, inseguranças, dúvidas, luta, determinação, fé, esperança e
muita, muita paixão.
Me lembro
exatamente do dia em que comecei a construir meu sonho de ser advogada. Era um
domingo, 13 de novembro de 2005. Eu não tinha nada, nada pra fazer, e encontrei
um velho livro da minha mãe chamado O Sol
é Para Todos. Nesta história, Atticus Finch, um advogado, defende Tom
Robinson, um negro acusado injustamente de estuprar uma mulher branca. Tarefa
dificílima (para não falar impossível) no sul dos EUA na década de 1930. No livro,
meu parágrafo favorito está no capítulo 11, quando Atticus diz a Jem, seu
filho, que “coragem é quando você sabe
que está derrotado antes mesmo de começar, mas começa assim mesmo, e vai até o
fim, apesar de tudo. Raramente a gente vence, mas isso pode até acontecer”.
Atticus era um advogado de causas impossíveis. Eu queria ser como ele. E uma
semente foi plantada.
Passei a
cultivar essa semente. Recebi incentivos e apoio ao manifestar, ainda que
vagamente, a ideia de estudar Direito. Tive medo, mas a determinação era maior.
Em maio de
2006 participei do FERA- Festival de Arte da Rede Estudantil. Ali, a semente
cresceu e se tornou um brotinho. Naquela semana, decidi, após várias conversas
e leituras sobre o assunto, estudar Direito de uma vez por todas. Nesses mesmos
dias participei de um concurso de redação promovido pelas Faculdades
Guarapuava, em que o primeiro lugar consistia numa bolsa de estudos integral
para o curso que eu desejasse. Em 13 de maio, após dançar ao som do povo livre dos
quilombolas, o resultado foi anunciado e eu venci. Eu fiquei tão chocada com
aquilo, “eu?” não dava pra acreditar. Parecia um zumbi ao receber o
certificado. Mas me lembro, ao subir ao palco para receber o prêmio, que
perguntaram “já sabe qual curso vai fazer?” não tive dúvidas. Quase sem pensar
respondi “Direito”.
No ano
seguinte, a faculdade começou. E foram cinco anos difíceis... em muitos
momentos o brotinho quase morreu. Quis muito deixar o curso em 2009, pensando
que não ia dar conta. Era impossível conciliar tudo. Entre vários arranjos, as
coisas retomaram seu curso normal.
Depois, com o
estágio obrigatório, me identifiquei de novo com o curso. Vida corrida,
faculdade, estágio, estágio obrigatório. Mas valia a pena. Era o meu sonho.
Deixei festas, encontros da PJ (alguns), partilhas e vivências para fazer grupo
de estudo, trabalhos ou mesmo correr atrás de algo do estágio. Eu teria a minha
recompensa.
Em 2011, o
maior de todos os desafios: o exame de Ordem. Finalmente meus conhecimentos
jurídicos seriam postos a prova, e eu estava apavorada. Não dormi na véspera da
primeira fase. Prova ferrada. Difícil. Desanimadora. Uma pedra no meu caminho
que me fez chorar por vários dias, desanimada... mas aí, a boa notícia: eu
tinha ido pra segunda fase, na linha (passei com 40 questões).
Novo desafio:
a segunda fase seria no domingo antes da apresentação do meu TCC. E duas semanas
antes, a conferência municipal de juventude da qual eu era da comissão
organizadora, e ainda, um final de semana de encontro sobre Pastoral, que eu
havia me comprometido a animar (não podia deixar os amigos na mão).
Foram cerca de
dois meses sem comer direito, saindo de casa antes das 8h e chegando depois das
23h (sem intervalo para almoços ou jantar). Eu estudava no ônibus, nos
intervalos do estágio, na hora dos lanches, e me revezava entre meu tcc e as
questões da OAB.
Em 13 de
setembro, o resultado final da OAB: aprovada! A alegria de ler “aprovada” no
resultado, de ver o nome na relação final é simplesmente INDESCRITÍVEL. Faz
tudo valer a pena e eu faria tudo de novo para ter essa sensação. Era só
esperar um pouco para tudo ser real. E o fim da espera chegou
Hoje, o
coração vai falar mais alto, com certeza. Todas essas cenas virão à cabeça
quando eu jurar defender a liberdade. O frio na barriga é gigante. Ainda tenho medos,
inseguranças, dúvidas, e são ainda maiores que os da menina de 16 anos que
plantou essa semente; mas minha determinação, fé, esperança e, principalmente,
minha paixão, é maior que todos esses obstáculos. Que venham mais desafios. Que
venham novos sonhos, porque eu vou realizá-los. Que venham novos obstáculos,
porque eu vou superá-los. Que venham novos sorrisos e que estes permaneçam
sempre.
E que hoje,
prevaleça a menina que leu encantada o discurso de Atticus Finch e que desejou
ser a advogada das causas impossíveis só pra mostrar que o impossível é só um
pequeno obstáculo dentro da gente mesmo. A única possibilidade que me foi
apresentada, desde o inicio, foi o impossível; e eu a quero mais que tudo. Estou
acostumada a desafios. Estou acostumada a surpreender. Só não quero que a
plantinha em mim morra. E que eu continue com muita coragem para os novos
sonhos... sim, eles já estão semeados, agora, é só cultivar.