terça-feira, 19 de junho de 2012

Advogado das causas impossíveis




Em que momento um sonho começa? Pergunta difícil. Subjetiva. Marcada por influências, incentivos, medos, inseguranças, dúvidas, luta, determinação, fé, esperança e muita, muita paixão.
Me lembro exatamente do dia em que comecei a construir meu sonho de ser advogada. Era um domingo, 13 de novembro de 2005. Eu não tinha nada, nada pra fazer, e encontrei um velho livro da minha mãe chamado O Sol é Para Todos. Nesta história, Atticus Finch, um advogado, defende Tom Robinson, um negro acusado injustamente de estuprar uma mulher branca. Tarefa dificílima (para não falar impossível) no sul dos EUA na década de 1930. No livro, meu parágrafo favorito está no capítulo 11, quando Atticus diz a Jem, seu filho, que “coragem é quando você sabe que está derrotado antes mesmo de começar, mas começa assim mesmo, e vai até o fim, apesar de tudo. Raramente a gente vence, mas isso pode até acontecer”. Atticus era um advogado de causas impossíveis. Eu queria ser como ele. E uma semente foi plantada.
Passei a cultivar essa semente. Recebi incentivos e apoio ao manifestar, ainda que vagamente, a ideia de estudar Direito. Tive medo, mas a determinação era maior.
Em maio de 2006 participei do FERA- Festival de Arte da Rede Estudantil. Ali, a semente cresceu e se tornou um brotinho. Naquela semana, decidi, após várias conversas e leituras sobre o assunto, estudar Direito de uma vez por todas. Nesses mesmos dias participei de um concurso de redação promovido pelas Faculdades Guarapuava, em que o primeiro lugar consistia numa bolsa de estudos integral para o curso que eu desejasse. Em 13 de maio, após dançar ao som do povo livre dos quilombolas, o resultado foi anunciado e eu venci. Eu fiquei tão chocada com aquilo, “eu?” não dava pra acreditar. Parecia um zumbi ao receber o certificado. Mas me lembro, ao subir ao palco para receber o prêmio, que perguntaram “já sabe qual curso vai fazer?” não tive dúvidas. Quase sem pensar respondi “Direito”.
No ano seguinte, a faculdade começou. E foram cinco anos difíceis... em muitos momentos o brotinho quase morreu. Quis muito deixar o curso em 2009, pensando que não ia dar conta. Era impossível conciliar tudo. Entre vários arranjos, as coisas retomaram seu curso normal.
Depois, com o estágio obrigatório, me identifiquei de novo com o curso. Vida corrida, faculdade, estágio, estágio obrigatório. Mas valia a pena. Era o meu sonho. Deixei festas, encontros da PJ (alguns), partilhas e vivências para fazer grupo de estudo, trabalhos ou mesmo correr atrás de algo do estágio. Eu teria a minha recompensa.
Em 2011, o maior de todos os desafios: o exame de Ordem. Finalmente meus conhecimentos jurídicos seriam postos a prova, e eu estava apavorada. Não dormi na véspera da primeira fase. Prova ferrada. Difícil. Desanimadora. Uma pedra no meu caminho que me fez chorar por vários dias, desanimada... mas aí, a boa notícia: eu tinha ido pra segunda fase, na linha (passei com 40 questões).
Novo desafio: a segunda fase seria no domingo antes da apresentação do meu TCC. E duas semanas antes, a conferência municipal de juventude da qual eu era da comissão organizadora, e ainda, um final de semana de encontro sobre Pastoral, que eu havia me comprometido a animar (não podia deixar os amigos na mão).
Foram cerca de dois meses sem comer direito, saindo de casa antes das 8h e chegando depois das 23h (sem intervalo para almoços ou jantar). Eu estudava no ônibus, nos intervalos do estágio, na hora dos lanches, e me revezava entre meu tcc e as questões da OAB.
Em 13 de setembro, o resultado final da OAB: aprovada! A alegria de ler “aprovada” no resultado, de ver o nome na relação final é simplesmente INDESCRITÍVEL. Faz tudo valer a pena e eu faria tudo de novo para ter essa sensação. Era só esperar um pouco para tudo ser real. E o fim da espera chegou
Hoje, o coração vai falar mais alto, com certeza. Todas essas cenas virão à cabeça quando eu jurar defender a liberdade. O frio na barriga é gigante. Ainda tenho medos, inseguranças, dúvidas, e são ainda maiores que os da menina de 16 anos que plantou essa semente; mas minha determinação, fé, esperança e, principalmente, minha paixão, é maior que todos esses obstáculos. Que venham mais desafios. Que venham novos sonhos, porque eu vou realizá-los. Que venham novos obstáculos, porque eu vou superá-los. Que venham novos sorrisos e que estes permaneçam sempre.
E que hoje, prevaleça a menina que leu encantada o discurso de Atticus Finch e que desejou ser a advogada das causas impossíveis só pra mostrar que o impossível é só um pequeno obstáculo dentro da gente mesmo. A única possibilidade que me foi apresentada, desde o inicio, foi o impossível; e eu a quero mais que tudo. Estou acostumada a desafios. Estou acostumada a surpreender. Só não quero que a plantinha em mim morra. E que eu continue com muita coragem para os novos sonhos... sim, eles já estão semeados, agora, é só cultivar.


sábado, 2 de junho de 2012

A MARCHA DAS VADIAS


Minha mãe costuma dizer que “quem tem boca fala o que quer”. De fato, somos livres pra expressar nossas opiniões, certo? Ao menos no mundo ocidental, marcado pela imposta liberdade do liberalismo político e econômico, esse ditado serve como uma luva.
            Nesse contexto, o policial canadense Michael Sanguinetti disse, em uma palestra, que as estudantes de uma universidade canadense deveriam parar de ir à aula com roupas de “vadias”, para acabar de uma vez com casos de estupro no campus.
            A questão gerou polêmica. As estudantes (logicamente) não deixaram barato e criaram o movimento “Slutwalk” (Marcha das Vadias). A ideia está sendo disseminada pelo mundo inteiro e milhares de mulheres (vadias ou não) aderiram ao protesto.
            Mas, o que protestar? A questão primordial não é o direito de se vestir como quer. Uma mulher pode se vestir como quiser para ir ao cinema, ao trabalho, para uma festa. E isso é norteado pelo bom senso.
            Por bom senso ser algo relativo e pessoal, marcado pela influência religiosa, cultural e, principalmente, moral que sofremos, quem somos nós pra julgar o que uma pessoa usa? Isso não significa nada. E como diz outro bom e velho ditado “o uniforme não faz o estudante”.
              Voltando à questão central, o policial canadense perdeu uma grande chance de ficar calado. Ao afirmar essa idiotice ele transformou vítimas em culpadas. A culpa de uma mulher ser estuprada é do homem, o causador da violência. Se o homem se diz racional, como não consegue controlar seus impulsos sexuais diante de uma mulher, e até mesmo diante de meninas (entenda-se CRIANÇAS)?
            Com essa afirmativa estúpida, Michael Sanguinetti disse que as mulheres são culpadas pela irracionalidade dos homens. A eterna culpa de Eva que levou Adão a comer do fruto proibido e assim Deus os expulsou do Paraíso. E isso não é novo. A história está cheia de episódios assim. Diante de uma sociedade marcada pelo patriarcalismo (e consequentemente pelo machismo) é sempre mais cômodo culpar a mulher.
            Essa questão é séria. Temos essa tendência a culpar a vítima e “perdoar” o culpado. É muito mais cômodo proteger homens nesse mundo machista. Existem até mesmo mulheres que concordam com esse policial, que acreditam que se sofressem algum tipo de violência sexual, a culpa seria delas que provocaram com a roupa ou o jeito de andar.
            Nesse caso, freiras e muçulmanas não sofreriam assédios e não seriam estupradas, afinal, elas se vestem “muito bem” e não há nada de sexy em hábitos ou burkas (ao menos pra mim). Mas, ao contrario, elas são tão vítimas de violência sexual quanto as vadias que Michael Sanguinetti falou. O estupro, inclusive, foi usado como arma de guerra contra muçulmanas durante a Guerra de Kosovo, causando a morte física e moral de milhares de mulheres.  E agora, de quem é a culpa?
            Seria cômico se não fosse trágico, mas a culpa é sempre da vítima (isso precisa ser sempre frisado). Uma criança de 5 anos é abusada sexualmente (e não vamos fechar os olhos pra essa realidade) mas o estuprador tem a audácia de dizer que ela o provocou. WHAT????? CUMA?????? Simplesmente não dá pra entender e mesmo que desse não faço questão alguma de compreender. Não faz sentido na minha cabeça de vadia um guardião da moral e dos bons costumes usar da força para conseguir o prazer sexual. Nenhum sentido mesmo.
            Essa é a lógica do sistema opressor, do sistema que mata: mudar o foco da discussão para manter um mundo cada vez mais conveniente ao interesse de poderosos que não respeitam a liberdade e a igualdade humanas. Isso é o mesmo que mudar o foco do problema, que é muito maior. Quanto machismo presente nas palavras do policial, não?
            Por isso mesmo, me coloco ao lado das “vadias” do mundo inteiro. Sou uma vadia que hoje está quase vestida como uma muçulmana, só faltou a burca (é que está muito, muito, muito frio) e estou gritando “Jesus ama as vadias”, tal como as mulheres do “Slutwalk”. Sou uma vadia que não aceita o descaso e desrespeito às mulheres (vadias ou não) em todo o mundo. Sou uma vadia porque sonho viver num mundo em que não haverá mais desigualdade em função do gênero, da etnia ou orientação sexual. Sou uma vadia porque me é insuportável pensar que meninas ainda são vendidas por seus pais para serem prostitutas, sem terem escolha alguma. Sou uma vadia porque é angustiante saber que mulheres muçulmanas são condenadas ao apedrejamento por escolherem outra pessoa para amar. Sou uma vadia porque quero liberdade; não a liberdade do liberalismo, mas a liberdade da poetisa Cecília Meireles, que no fascinante Romanceiro da Inconfidência expressa o sentimento de milhares de oprimidos e oprimidas com os versos “Liberdade - essa palavra,que o sonho humano alimenta:que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda”, quero a liberdade de escolher o caminho que vai alimentar minha alma e quero saber que o ser que tentar usar da força pra impedir minhas escolhas vai ser punido caso haja assim. 
           Por isso afirmo que se ser livre é ser vadia, eu sou vadia. Não gosta da palavra vadia? Ela te ofende? Pois o que me ofende é saber que mulheres são violentadas física, sexual e moralmente todos os dias e não está sendo nada feito para reverter esse quadro. Tá na hora de rever certos valores opressores num mundo em que ocorreu a vitória, ao menos teórica, dos direitos humanos.
            Pois é... minha mãe diz “quem tem boca diz o que quer” e eu respondo “e quem tem ouvidos escuta o que não quer duas vezes”. E os machistas/conservadores/coronéis terão que escutar nossos gritos de vadias livres, que escolheram o caminho da liberdade e da igualdade. ESCUTARAM?????

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Para as Marias Madalenas


“Mulher, por que choras”?
Choras por todas as dores, medos e torturas que fostes submetida ao longo dos séculos...
Choras por que te chamam de prostituta e denigrem a tua imagem...
Choras por todos os estereótipos que criaram e que não te retratam...
Choras por que fostes morta na tua integridade física e moral...
Choras porque não tens direito ao teu próprio corpo...
Choras porque te entregam para casamentos forçados, como se fosses um ser sem vida...
Choras porque te vendem para a prostituição e te transformam em mercadoria...
Choras porque te culpam pelo descontrole sexual de tantos homens...
Choras porque passas fome e sede e assim, não podes alimentar teus filhos...
Choras porque não te dão espaço na ciência, na política, na religião...
Choras porque não te permitem ser quem és...
Choras porque eles mataram teus sonhos e tuas esperanças...
Choras porque mataram o teu Deus, o Deus que está em Ti, o Deus que é mais Mãe, o Deus que acolhe todo o sagrado que se manifesta no teu ventre, nos teus olhos, no teu coração, no teu corpo...
Mas, não, Maria... ele não está morto. Ao contrário. Ele VIVE!
Ele vive nos teus sonhos de um mundo igual, em que não há distinções de credo, raça, orientação sexual, culturas e, principalmente, de GÊNERO.
Ele vive no teu desejo de liberdade... liberdade pra escolher o teu companheiro e se queres ter um companheiro... liberdade para encontrar o teu caminho...
Ele vive no teu anseio de trabalho, de trabalhar ao lado dos homens, com direitos iguais, mas respeitando as diferenças naturais...
Ele vive na tua luta de ser protagonista da tua história, senhora do teu destino, autora do teu caminho...
Ele vive no teu dia-a-dia, nas tuas pequenas conquistas que transformam esse mundo num mundo mais justo, livre e igual...
Ele vive!!!!!!!!!!!!!! ELE VIVE!!!!!!!!!!!
Vais e anuncia isso aos teus irmãos e à tuas irmãs, o Ressuscitado quer se encontrar com eles...
Vais, Maria Madalena!
És mulher da luta, do labor, do suor, das lágrimas e do sorriso!
És a primeira testemunha do Deus Vivo, Verdadeiro e Ressuscitado!
És a autêntica mensageira da Boa-Nova; a ti, cabe a linda missão de anunciar a VIDA e promover a vida de todos...
És a profeta do novo, que anima a comunidade e que permanece fiel ao Evangelho...
És Maria, mulher de atitude, “que merece viver e amar, como outra qualquer no planeta”, mulher que assume as lutas do seu povo e se propõe a buscar um novo caminho...
És Maria Madalena, carregas essa marca na tua vida, És Maria Madalena, tu possuis “a estranha mania de ter fé na vida”.
És Maria Madalena, és Maria, és Mulher!!!
Vais, mulher, enxuga as lágrimas e segue o teu caminho... Tu precisas anunciar o Novo...

terça-feira, 27 de março de 2012

Discurso de oradora da turma - Direito 2007-2011 - Faculdade Guarapuava



“Amanhã será preciso lutar ainda, mas hoje somos vencedores. É uma vitória, aconteça o que acontecer (...)” (Simone de Beauvoir).

Ilustríssimo Prof. Dr. Carlos Alberto Gomes, Diretor Geral da Faculdade Guarapuava e demais componentes da mesa;
Prezados professores;
Prezados funcionários;
Queridos colegas;
Estimados pais, demais familiares;
Senhoras e Senhores:     

            Quero, inicialmente, agradecer aos meus colegas por me escolherem para representá-los. É uma honra e um grande prazer. Não é uma tarefa fácil. Cinco anos não cabem em “algumas poucas” páginas. Mas, prometo fazer o melhor possível.
            Numa noite de verão, como esta, nós iniciamos uma longa jornada. E agora, fazemos memória de tudo o que passamos para chegar até este momento.
Quando nos encontramos pela primeira vez muitos de nós ainda eram adolescentes, recém saídos do Ensino Médio, cuja única preocupação era “a balada do fim de semana”, e um possível namorado/namorada, ou mesmo uma paquera inocente. Bons tempos, não?
            Outros, já tinham mais experiência. Muitos eram pais e mães de família, que trabalhavam todo o dia e precisaram abrir mão da convivência com seus cônjuges e filhos em busca de algo diferente e maior.
            Outros não eram pais, nem tinham constituído sua própria família, mas já trabalhavam e levavam uma vida muito mais focada na luta pelo sustento diário.
            O que pessoas tão diferentes poderiam ter em comum?
            Um sonho. O sonho de estar hoje aqui. O sonho de concluir um curso superior. E não um curso superior qualquer. Nós ousamos estudar Direito.
            Por isso, parabéns a todos nós! Nós sabemos que não foi nada fácil chegar até aqui. E digo, não foi nada fácil mesmo.
            Passamos por cerca de cento e quarenta avaliações (isso sem contar os exames); por meus cálculos superficiais, cinco mil páginas de livros; incontáveis artigos de leis; diversos fins de semana estudando; trabalhos acadêmicos que pareciam não ter fim (principalmente nas semanas de provas); horas e horas dedicadas ao Direito no Núcleo de Prática Jurídica ou nos nossos estágios extracurriculares.
            Apesar das dificuldades, trilhamos um caminho maravilhoso, com muitas conversas, brincadeiras e sorrisos.
            Nossos professores sofreram conosco. No início, com nosso descaso “para quê filosofia, sociologia, ciência política?” e depois, a dificuldade propriamente dita, com as teorias mais incompreensíveis do nosso Sistema Jurídico “É competência absoluta ou relativa?” ou “É herança ou meação?” ou “Quais os critérios do relaxamento da prisão?”.
            Entre cadernos de colegas e Códigos Comentados, descobrimos o significado da palavra amizade.
            Os dias de avaliação foram difíceis. Entrávamos na sala e estavam todos com um semblante sério, lendo, por uma última (ou pela primeira vez) as anotações, livros ou até (por via das dúvidas) a cola que nunca tínhamos coragem de usar.
            Também tivemos momentos excelentes. Momentos que deles poderíamos falar por horas e horas e ainda assim o tempo seria curto. O que dizer dos churrascos com cerveja, truco e tequila? O que dizer das quartas-feiras em que trocávamos as aulas por um jogo de futebol? O que dizer dos dias em que estendíamos as aulas na casa de um colega, com a desculpa esfarrapada de estudar? A verdade é que só queríamos tomar uma gelada, comer uma pizza ou um sanduíche, ou mesmo, só conversar com os amigos.
            E o que falar daquele banquinho? Aquele banquinho escutou nossos lamentos e risadas, assistiu nossas lágrimas e vitórias e compartilhou conosco Halls, cigarros e chocolates. Mas compartilhou, principalmente, a vida, com todas as nossas decepções e conquistas, tristezas e alegrias, abraços e sorrisos, silêncios e euforias. Aquele banquinho sem vida assistiu a nossa vida acontecer, assistiu tudo o que passamos para estarmos aqui, nesta data.
            Foram cinco anos que dedicamos quase que exclusivamente ao estudo do Direito. E para quê? Para continuarmos estudando Direito pelo resto de nossas vidas.
            Hoje celebramos o fim de uma etapa. É clichê, mas verdade: vencemos uma batalha, mas não a guerra.
            Podemos falar com propriedade diversos conceitos sobre o Direito e sua finalidade. Entretanto, de todos esses conceitos, prefiro um conceito que aprendemos em uma das primeiras aulas. O Direito é tão somente a busca pela Justiça.
            E o que é a Justiça? Isso sim é uma pergunta que envolve um debate maior que o próprio Direito. Tal conceito sofreu muitas evoluções passando por Aristóteles, pelos pensadores cristãos, Rousseau, Montesquieu, Hegel, Marx e tantos outros. De forma objetiva e resumida podemos afirmar que Justiça é respeito. Respeito à Soberania e à Cidadania de um povo, mas acima de tudo, repeito à Dignidade da Pessoa Humana. Através do respeito promovemos a Justiça.
            Liberté, Egalité, Fraternité. O que nos lembra esse lema? Foram várias aulas escutando esse lema, e acredito que por uma razão muito simples: o lema da Revolução Francesa traz o que os operadores do Direito devem defender. Somente a liberdade, a igualdade e a fraternidade levam os povos à Justiça.
            Isso não significa defender leis ou tudo o que está positivado. Em sua defesa num processo devidamente legal, mas ilegítimo, o advogado sul-africano Nelson Mandela afirmou “Eu não me considero nem legal nem moralmente obrigado a obedecer leis feitas por um Parlamento no qual não tenho nenhuma representação”. Hoje nós podemos utilizar esta frase toda vez que uma injustiça for feita em nome da Lei. Leis injustas não representam nossos anseios. Representam tão somente o interesse dos poderosos em manter um sistema que mata e oprime. Nosso desejo é um povo livre e soberano, que viva os princípios trazidos pela Revolução Francesa na sua plenitude, que é a Justiça. E se a Lei ou o que quer que seja não traz Justiça, então não merece a nossa defesa.
            Em um mundo em que 2/3 da população mundial passa fome, milhares estão presos sem o devido processo legítimo; negros, povos indígenas, homoafetivos, mulheres e crianças sofrem massacres pelo simples fato de não estarem dentro de um padrão ideal de sociedade e, ainda, milhares de seres humanos são tratados como escravos, lutar por Justiça não é tarefa das mais fáceis. Pelo contrário. Somente pessoas determinadas assumem essa tarefa.
            Queridos colegas, o caminho continuará difícil e teremos muitos tropeços pela frente. Mas, quando esses tropeços chegarem, lembremos das sábias palavras de outro brilhante homem, o advogado Mahatma Gandhi, que nos deixou que é preciso “buscar no interior de si mesmo a resposta e a força para encontrar a saída”.
            Cada um que está aqui possui uma força inimaginável para lutar pelos seus sonhos, para lutar por um mundo em que prevaleça a utopia de todos os homens: a liberdade e o amor. E o que eu desejo para cada um é que sempre encontrem essa força, mesmo nos momentos de maior desespero, em que a vontade maior é a de largar todos os sonhos e convicções e mudar radicalmente de vida.
            Será que vamos alcançar a Justiça? Eu não sei.
            O que eu sei é que ainda temos uma guerra pela frente e precisaremos lutar muito. Mas, queridos amigos, quando essas dificuldades aparecerem nos lembremos daquela noite de verão, em que tudo começou; lembremos desta noite de verão em que terminamos esta etapa; e, mais importante, lembremos de cada um e de cada uma que aqui está presente e que, assim, possamos superar os inúmeros desafios que teremos pela frente, na luta por Justiça.
            E como já mencionado no início, não importa o que aconteça, corações corajosos e determinados são sempre vencedores.
            Muito obrigada e muito sucesso para cada um de nós!

quarta-feira, 7 de março de 2012

Oito Minutos

            O sol está distante da Terra cerca de 150 milhões de quilômetros. Considerando que a luz viaja 300 mil Km/s, conclui-se que a luz solar demora cerca de 500 segundos para chegar até a Terra o que, convertendo em minutos, equivale a cerca de 8,3 minutos. Ou, arredondando pra baixo, 8 minutos.
            A luz que ilumina nosso caminho para o trabalho, que brilha em nossas janelas ao nos acordar e que é o principal combustível para a fotossíntese das plantas e pra nossa vida, é uma luz que viaja por 8 minutos pelo espaço sideral para chegar até nós.
            Se um dia o sol explodir (o que é pouco provável, mas não impossível), nós, meros mortais, ainda vamos aproveitar a luz solar por 8 minutos.
            O que faríamos nesses 8 minutos? Muitos se converteriam (“Eu avisei que o Juízo Final seria hoje” diriam vários “profetas” contemporâneos), outros se matariam de uma vez para poupar maiores sofrimentos, afinal, sem o sol, não temos a menor chance de sobreviver. Mas alguns tentariam prolongar os oito minutos da luz solar, através de estufas artificiais, fogueiras com todo o material disponível (muitos livros encontrariam alguma utilidade) e armazenariam todo o tipo de mantimentos, até que se chegasse ao fim toda a matéria prima do planeta.
            A vida se prolongaria por dias, semanas, talvez até meses, mas os 8 minutos chegariam ao fim. E todos morreriam.
            Certas coisas não se podem evitar. E isso não é algo que se aprende em casa ou na escola, só aprendemos isso ao nos depararmos em uma situação assim: querer continuar com algo que está chegando ao fim.
            Infelizmente, todos passam por uma situação como essa, em maior ou menor proporção. Todos tem um sol que, do nada, numa linda noite de verão, explode. O problema é que o calor e a luz do sol fazem tão bem que gostaríamos de prolongar ao máximo esses últimos minutos em que sentiríamos essa presença. Mas a própria natureza, ou a vida, ou o destino, ou um ser superior a tudo isso, nos impede que esses 8 minutos sejam eternos. E se há alguma verdade nesse mundo é isso: não há nada que se possa fazer para evitar.
            Quantas pessoas-sol, sonhos-sol, amores-sol, vidas-sol explodem na nossa vida e adoraríamos que os nossos últimos 8 minutos com eles fossem prolongados e eternizados?
            Todos falam que a morte é o mais triste da vida. Eu não consigo concordar com isso. O pior é o adeus, já que ninguém nos prepara pra ele. Enterrar um ente querido não é tão difícil quanto dizer “adeus, vou seguir agora sem você”. Seguir o caminho sem o que amamos é o mais complicado.
            O que deveríamos aprender é que, ao contrário da Terra, que não tem escolha, nós podemos ter novas estrelas pra nos guiar e ser nossa luz. Dar adeus ao sol das nossas vidas não significa apagar a lembrança, mas continuar, em busca de um novo sol.
            E isso, que não precisa de explicação científica, é o que precisamos para não morrer. Estrelas desaparecem, todavia, outras surgem; é só preciso procurar! Mas pra isso é preciso seguir, e não prolongar os 8 minutos.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Mamonas Assassinados

           

            Há exatamente 16 anos, uma garotinha chorou a morte precoce dos ídolos. Mas não foi só essa menininha. Milhares de crianças, adolescentes e jovens choraram a morte de um dos maiores fenômenos midiáticos que a música já viu: o quinteto de Guarulhos formado pelo guitarrista Bento, os irmãos Sérgio (baterista) e Samuel (baixista), o tecladista Júlio e claro, o peculiar vocalista, Dinho.
            Não é exagero afirmar que milhões de fãs choraram sua morte. Em alguns meses, os Mamonas Assassinas conquistaram o Brasil e teriam conquistado o mundo não fosse aquela trágica noite de 2 de março de 1996, onde, após agradecerem a Santos Dumont que “inventou o avião” foram vítimas de um acidente fatal com uma aeronave. Não houve sobreviventes. É uma dessas coisas que nem mesmo o tempo consegue explicar, muito menos a história.
            Até hoje, milhares de fãs se lembram com carinho desse grupo que conquistou a todos com sua jocosidade e diversão. É claro que a mídia foi fundamental para esse sucesso. Mas foi só publicidade? Será que eles teriam conquistado milhões de fãs em tão pouco tempo se tivesse sido um mero golpe de empresários?
            Os Mamonas Assassinas, a princípio, não era uma banda “divertida”. O nome do grupo era “Utopia”, a famosa palavra utilizada por idealistas da década de 1960 e 1970, e tinham forte influência do rock brasileiro da década de 1980, a maturidade do nosso rock, com protesto e poesia na medida certa.
            Mas o conjunto não vingou. Tiveram que inventar um outro jeito de dar certo. E o jeito foi esse: brincando no palco, fazendo anedotas, utilizando métodos considerados por alguns até “apelativos”.
            Mas os Mamonas falaram ao coração das crianças e das juventudes. Não eram só um produto da mídia, muito, mas muito mesmo de “Utopia” estava com eles. Já parou pra escutar as letras deles? Esqueça o lado jocoso e engraçado fortemente explorado. Em suas letras, ainda que de forma irônica e cética (o que não deixa de ser engraçado) eles falaram verdades. Só alguns trechos pra pensarmos. Em “Mundo Animal” eles cantam “O homem é corno e cruel, mata a baleia que não chifra e é fiel”. Alguém pode contestar essa verdade? Hoje, ao vermos a realidade do meio ambiente, não dá pra não pensar em como o ser humano destrói a vida da qual ele necessita, a vida que tem todas as qualidades que lhe falta.
            Outra canção que eu particularmente adoro é “Cabeça de Bagre II”. Numa época em que nos preparamos pra sediar uma Copa do Mundo, esse trecho vem bem a calhar “Fome, miséria, incompreensão, o Brasil é ‘treta’ campeão” (só lembrando que na época dessa canção o Brasil havia acabado de conquistar o tetra campeonato mundial de futebol nos EUA) e mais adiante “Na política o futuro de um país, cala a boca e tira o dedo do nariz” mostrando como o mundo contemporâneo é desacreditado no valor da política. O típico retrato de uma nação.
            “Robocop Gay” é o retrato perfeito da erotização da relação humana. Tanto faz se você é homo ou hetero, o importante é estar inserido em algum estereótipo sexual que o mundo pós-moderno criou.
            A divertida “1406”, um dos maiores clássicos “Pelados em Santos” e “Chopis Centis” tem em comum o forte apelo ao consumo, típico do mundo contemporâneo neo liberal. Em “1406” cantamos “Money que é good e nóis num have, se nóis hevasse nóis num tava aqui playando, mas nós precisa de workar”, onde, além de mostrar nosso lado mais consumista também mostra a triste influência norte americana, que destrói nosso idioma e nossa cultura, como um todo. Em “Pelados em Santos” os versos “Pro Paraguai ela não quis viajar (...) eu não sei o que faço pra essa mulher eu conquistar porque ela é linda (...)” também mostra a superficialidade em que se baseiam as relações humanas e “Chopis Centis” chega ao extremo do vazio humano no mundo contemporâneo com o refrão “Quanta gente, quanta alegria, a minha felicidade é um crediário nas Casas Bahia”.
            São só alguns pontos que quero mencionar, dá pra fazer um estudo muito mais detalhado dessas letras. No Ensino Médio (tipo, na Idade Média) fiz um trabalho bem completo sobre as canções deles, analisando o estilo, as influências contemporâneas (principalmente “sartreanas”) e as letras. Se entre meus inúmeros papéis (que nunca tenho coragem de mexer) eu encontrar, posto aqui.
            Enfim, escrevi tudo isso pra lembrar que não devemos assassinar os Mamonas. Eles foram mais que sua jocosidade, que sua brincadeira, que seu jeito alegre. Eles falaram ao coração das crianças e dos jovens. À sua maneira, expressaram o que todos nós sentimos diante desse mundo tão conturbado.
            Já basta a morte deles uma vez. Não vamos assassinar seu trabalho. Não vamos matar sua mensagem. Eles foram mais que um fenômeno midiático. Eles gritaram de um jeito diferente tudo o que nós queremos gritar e muitas vezes somos calados. Eles não são só os Mamonas. Eles são também Utopia. Distorcer a obra dos Mamonas é matar também a garotinha que chorou há 16 anos atrás, e as milhares de crianças e jovens que também choraram. Eles amam os Mamonas/Utopia e amam, acima de tudo, tudo o que eles produziram.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Sonhos



Todo mundo já teve sonhos, não é mesmo? Quem nunca se debruçou sobre uma janela numa noite estrelada, ou ficou debaixo de um céu estrelado, e desejou com todo o coração alguma coisa, não pode se considerar pleno.
            Os sonhos nos movem. Como alguém pode não sonhar? É praticamente impossível. Lógico que existem sonhos de todos os tipos. Tem gente que tem um sonho de toda uma vida. Outros começam a sonhar algo quase que do nada. Há sonhos gigantes. Há sonhos menores. Há sonhos que não se realizam. Há sonhos que se realizam de forma inesperada. Enfim, existem sonhos de todos os tipos, para cada pessoa.
            A coisa mais cruel que se pode fazer com alguém é dizer que essa pessoa nunca vai realizar o sonho, ou, dizer que aquele sonho é idiota. É só ler as primeiras páginas do livro “O Pequeno Príncipe” pra ver como a pessoa se sente. E daí que a criança quer ser um astronauta? Sempre tem aquela pessoa racional demais que vai dizer “ai, mas astronauta nem existe no Brasil (o que não é verdade)... ele vai sofrer muito... ele vai ter que estudar muita física e química pra isso... ele vai ter que falar inglês fluente”. Sim, isso também. Mas é com o tempo que a pessoa vai planejando como realizar o sonho. Antes disso, deixa a criança ou adolescente olhar a janela e sonhar com o dia em que estará nas estrelas. Será que é tão difícil deixar que ao menos as mentes sejam livres?
            Se o sonho não for verdadeiro, com o tempo ele vai morrer por si mesmo. Acontece. Sonhos são como pessoas numa estação de trem. Eles vão embora. Eles entram na nossa vida. Eles saem antes que consigamos realizá-los. Às vezes tentamos escondê-los de nós mesmos.
            Porém, se o sonho for verdadeiro... ah, não importa. Uma hora ele vai se realizar. Pode demorar um mês, um ano, dez anos ou uma vida inteira... mas vai se realizar.
             Mas eu tenho medo disso... confesso que estou prestes a realizar sonhos que esperei por muito tempo... sonhos que por várias vezes fizeram me debruçar sobre a janela, olhando pras estrelas, pensando... e, agora paira a dúvida: e se não for como eu sonhei? E se acontecer algo e estragar esses momentos que por tanto tempo esperei? E se eu estragar tudo? E depois, como vai ficar?
            Vendo bem isso, percebo que a melhor parte é essa: depois eu vou ter que encontrar outros sonhos. Vou continuar olhando as estrelas e imaginando a hora de realizá-los. Vou continuar com o mesmo olhar perdido para o nada quando eu sonhar, o olhar perdido que nos faz enxergar tanta coisa linda.
            Por hora, quero curtir os próximos meses que serão de muitas realizações.
            Nada de medo (esse conselho vale pra todo mundo)... curta seus sonhos, aproveite a realização. Depois virão outros sonhos e outras realizações. E que esse ano todos possam dizer que realizaram tudo o que sonharam, para continuar sonhando e crescendo sempre mais.